Isolamento social e saúde mental: como se manter saudável?

Na última semana, devido à pandemia da Covid-19, fomos orientados a ficar em nossas casas com o intuito de evitar a propagação do vírus e também de nos protegermos de possíveis contágios. Sendo assim, estamos as voltas com uma restrição social até então não conhecida por muitos indivíduos.

As escolas e os comércios estão fechados, muitas pessoas estão trabalhando dentro de suas casas, os parques, ruas e praças estão vazios. Diante desse cenário e das medidas tomadas pelo Governo, é natural nos depararmos com o medo do que está por vir. Não temos informações solidas do prazo que teremos que ficar isolados em nossas casas e das consequências que essa pandemia irá trazer. Porém, é necessário nos atentar, pois o medo pode abrir portas para quadros ansiosos e/ou depressivos. Por isso, é importante pensarmos em estratégias para cuidar, não só do físico, mas principalmente, do emocional.

Na tentativa de preservar a saúde mental, seguem algumas orientações que podem ser eficazes nesse momento:

– Estabelecer uma rotina onde caibam práticas saudáveis: trabalho, cuidados com a casa, exercício físico, espaço para reflexão e lazer;

– Através do uso de tecnologias, manter contato frequente com parentes e amigos;

– Se manter informado das notícias diárias, porém ser muito cauteloso com as chamadas fake news. Também é importante delimitar a quantidade de notícias absorvidas ao longo do dia, pois o excesso de informação é tão prejudicial quanto a falta dela;

– Para aqueles que fazem uso da psicoterapia, é de extrema importância dar continuidade ao processo psicoterapêutico (de forma online), com o intuito de evitar desorganizações psíquicas diante do cenário atual.

 

Orientações para psicoterapia online

De acordo com o Conselho Federal de Psicologia, a prestação de serviços psicológicos por meio de tecnologias da informação e da comunicação é regulamentada pela Resolução CFP nº 011/2018.

Diante do cenário de pandemia, fez-se necessário suspender os atendimentos psicoterapêuticos presenciais, com o intuito de proteger os pacientes de possíveis contágios, e iniciar uma dinâmica de atendimentos online.

Sendo assim, seguem algumas orientações para estruturar esse novo modelo de atendimento e tornar eficazes as sessões online:

– As sessões seguirão os dias e horários combinados previamente com o psicoterapeuta;

– As sessões podem ser realizada por computador, celular ou telefone, de acordo com o que for mais confortável para o paciente. Porém, se a escolha for vídeo chamada, é necessário averiguar a conexão com a internet para que não haja entraves durante o atendimento;

– Assim como o psicoterapeuta, o paciente deve procurar um espaço reservado, no intuito de assegurar sua privacidade e o sigilo da sessão;

– O uso de fone de ouvido potencializa a privacidade da sessão.

– Se houverem outras pessoas na casa, o paciente pode conversar sobre a necessidade de privacidade durante a sessão e se mesmo assim não ficar à vontade, o paciente pode ligar um som ambiente para evitar que a sua voz se propague pelos outros cômodos da casa.

Covid-19 e a Psicologia

Diante da pandemia da Covid-19, a Organização Mundial da Saúde, o Ministério da Saúde e o Governo de São Paulo nos orientaram para que ficássemos em nossas casas, em um isolamento voluntário, na tentativa de atenuar os impactos do vírus na sociedade.

Pensando na integridade física e psíquica dos pacientes, o Conselho Federal de Psicologia autorizou que os psicólogos utilizassem de recursos tecnológicos, tais como o computador, celular ou telefone para dar continuidade aos atendimentos psicoterapêuticos. Sendo assim, os atendimentos presenciais estarão suspensos até que a situação do país volte a se normalizar.

Recomendações da Organização Mundial de Saúde sobre medidas de prevenção:

– Lavar as mãos frequentemente com água e sabão;

– Usar antisséptico de mãos à base de álcool gel 70%;

– Ao tossir ou espirrar, cobrir boca e nariz com a parte interna do cotovelo, evitando usar as mãos;

– Optar por lenços descartáveis;

– Manter os ambientes ventilados, com janelas abertas;

– Caso apresente os sintomas, procurar os serviços de saúde.

A Psicoterapia Infantil

Não é raro surgirem questionamentos sobre os métodos utilizados em uma psicoterapia infantil. Algumas pessoas fantasiam que a psicanalise é lugar apenas para quem é capaz de deitar no divã e falar, através de um discurso refinado, sobre sua dor. Há também dúvidas sobre a relevância do brincar: “mas meu filho virá aqui só para brincar?” e a resposta correta é “sim e não”. O brincar, para a psicanálise, é de extrema importância para o desenvolvimento do indivíduo e é a partir dele que a criança é capaz de visitar situações difíceis, traumáticas ou confusas e elaborar de maneira saudável o que, até então, gerava angústia.

No livro O brincar e a realidade Winnicott diz que é somente no brincar que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e descobrir seu self. Além disso, é somente no brincar que é possível a comunicação. O autor considera que a psicanálise é uma “forma altamente especializada do brincar, a serviço da comunicação consigo mesmo e com os outros” (WINNICOTT, 1975, p. 63). Quando o paciente não é capaz de brincar, o terapeuta deve dirigir seu trabalho no sentido de levá-lo a conseguir brincar.

Sendo assim, um consultório de psicoterapia infantil deve conter brinquedos, materiais gráficos, jogos e o que mais for necessário para disponibilizar um setting onde a criança se sinta confortável para criar. Além disso, é necessário que o psicólogo infantil seja capaz de acolher todas as fantasias que o paciente traz e, quando necessário, ajudá-lo a nomear e contornar as emoções e sentimentos que surgem a partir da brincadeira e ressignificar as experiências vividas.

Rubem Alves fala em um trecho de Coleção Estórias para Pequenos e Grandes sobre como é possível dar outros significados para os conflitos da infância através de contos, traduzindo com precisão a prática do espaço terapêutico:

“O mundo das crianças não é tão risonho quanto se pensa. Há medos confusos, difusos, as experiências das perdas, bichos, coisas, pessoas que vão e não voltam…(…) Não é possível fazer de conta que eles [os temas doloroso] não existem. Os maus espíritos, a os espanta chamando-os pelo nome real… O objetivo da estoria é dizer o nome, dar às crianças símbolos que lhes permitam falar sobre seus medos. E é sempre mais fácil falar sobre si mesmo fazendo de conta que está falando sobre flores, sapos, elefantes, patos…(…)”

A importância do silêncio

Trecho retirado da página WINNICOTT EM DOSES (www.facebook.com/winnicott1966):

“O silêncio é aquele ‘desconhecido’ que não nos instiga mais a sermos aventureiros, se tornou algo incômodo, desinteressante diante do ‘barulho’ ensurdecedor que me impede de me ouvir… mas eu quero mesmo me ouvir? Ou só quero respostas prontas em frases simples que me acalmam e não me fazem pensar? Eu consigo aceitar que há dúvidas que não têm respostas? Enfim… em nossa sociedade é difícil lidar com o silêncio! Esse é um aprendizado que se pode obter na análise.”

O Professor Suficientemente Bom

Antes da criança chegar ao ensino fundamental

Quando nascemos, somos totalmente dependentes de um outro, não só para a sobrevivência corpórea, mas também para a construção psíquica. É necessário que exista alguém para realizar os cuidados básicos para o bebê, como alimentá-lo, limpá-lo e protegê-lo. Porém, apenas esses cuidados podem não ser suficientes para o desenvolvimento emocional saudável de uma criança.

É preciso que o cuidador olhe para o bebê e lhe apresente o mundo, ajudando-o na construção do Ser. Para que isso ocorra, é necessário que o cuidador se doe para o bebê, e coloque à disposição dele o seu próprio corpo e também o seu desejo.

Desse modo, não é esperado que o bebê reproduza uma cópia fiel dos desejos e dos gostos do cuidador e sim, que a partir desta disponibilidade, o bebê seja capaz de descobrir o mundo  através do seu próprio corpo e desejo.

Donald Winnicott foi um pediatra e psicanalista inglês que acreditava que o meio ambiente é muito importante para o desenvolvimento emocional do bebê. A sua teoria que permanece aceita, nos dias atuais, é de que a mãe não precisa ser perfeita e completa, somente precisa ser suficientemente boa.  A mãe suficiente boa é aquela que atende as necessidades fisiológicas tais como alimentar, limpar, agasalhar e as emocionais como apoiar, oferecer carinho, proteção e estimulação. Além disso, é necessário que a mãe vá aos poucos frustrando seu bebê, para que ele consiga lidar, pouco a pouco, com a realidade e possa enfrentar o mundo na medida em que se desenvolva. Importante ressaltar que ser uma mãe suficientemente boa é algo que acontece natural e intuitivamente, para a maioria das mães.

Quando a criança chega à escola, espera-se que o seu desenvolvimento emocional tenha alcançado determinado ponto no qual ela seja capaz de lidar com a vida social escolar, com as suas regras e cobranças, de modo satisfatório. Porém, surge uma pergunta: será que todas essas crianças tiveram uma mãe suficientemente boa? Se a resposta for não, como o professor poderá contribuir para que tal criança possa resgatar esse cuidado inicial e consiga se desenvolver de modo satisfatório?

Provavelmente, uma criança que não teve uma mãe suficientemente boa ou um ambiente saudável no qual pudesse se desenvolver, não adquiriu conceitos de segurança e de organização interna e externa. Sendo assim, essa criança levará para a escola os seus medos e a sua desorganização e dificilmente irá responder adequadamente as exigências da escola.

Em tal situação, o professor terá um papel muito importante na vida dessa criança. O professor poderá, dentro da sala de aula, olhar genuinamente para a criança, isto é, olhá-la com verdadeiro interesse e lhe oferecer a sua presença viva e os seus recursos para que, a partir dessa experiência afetiva, a criança possa desenvolver os seus próprios recursos. Winnicott dizia: Quando olho, sou visto; logo existo. Posso agora me permitir olhar e ver.

Professor suficientemente bom

É importante entender que não cabe ao professor assumir a criação do seu aluno, cabe à escola outro papel, o de formação. Porém, se a criança apresenta um déficit, o professor pode ser alguém capaz de promover mudanças e de construir com a criança outros caminhos que poderão ser seguidos.

O professor suficientemente bom não é o professor perfeito tampouco é o professor permissivo ou passivo. O professor suficientemente bom é aquele que acolhe e que apresenta dados de realidade à criança; é aquele que suporta que a criança experimente a frustração entendendo que esta também é um organizador que promove o pleno desenvolvimento. Além disso, o professor suficientemente bom pode ser uma figura de autoridade, pois a criança precisa de referências e regras, mas é necessário saber a diferença entre autoridade e autoritarismo. A autoridade dá os limites e oferece segurança à criança, enquanto que o autoritarismo não permite que a criança tenha as suas próprias experiências e, muitas vezes, ajuda a formar indivíduos inseguros e agressivos.

Psicanálise Winnicottiana

Donald Woods Winnicott (1896-1971) foi um pediatra e psicanalista inglês, que se interessou nas relações familiares da criança e o meio ambiente em que ela estava inserida. Ele acreditava que todo ser humano tem um potencial para se desenvolver, porém, para que isso ocorra de forma saudável e plena, o ambiente é fundamental.

Inicialmente, para o bebê o “ambiente” se resume a mãe ou uma figura que faça esse papel. Partindo dessa ideia, surge o termo winnicottiano “mãe suficientemente boa”, onde a mãe (ou a figura materna) não precisa ser perfeita, apenas suficiente. Além dos cuidados básicos referentes à higiene e alimentação a mãe também precisa acalentar seu bebê, investindo energia, expectativas e desejos nele. É preciso que a mãe olhe para seu bebê, pois é pelo olhar dela que o bebê começa a ver o mundo. Juntamente com o investimento e a aposta, é necessário que a mãe permita progressivamente que seu bebê se frustre na medida em que ele suporta.

Nesse meio tempo, o bebê costuma fazer uso de objetos transicionais. Para Winnicott, objetos transicionais são objetos, geralmente macios (cobertor, paninho, urso de pelúcia) que o bebê adota e faz o uso que quiser. Esses objetos são chamados de transicionais, pois estão no espaço entre o mundo interno do bebê e o externo (meio ambiente).

Winnicott dizia que para alcançar o desenvolvimento saudável e pleno, passamos por fases de dependência (quando crianças) até chegar à independência, caminhando assim para a idade adulta, quando estabelecemos nossa identidade pessoal.

Infelizmente, ao longo de nossas vidas, nem sempre temos um ambiente acolhedor ou experiências saudáveis, o que pode gerar algumas falhas em nosso desenvolvimento. Sendo assim, quando houver falhas iniciais de grande significado na vida do indivíduo, o papel do psicólogo winnicottiano é recriar um processo inicial da vida do paciente, para que ele se sinta em um ambiente terapêutico especial e consiga regredir a fases iniciais de dependência, se fortalecendo psiquicamente e resignificando experiências vividas, possibilitando assim que seu desenvolvimento emocional seja, finalmente, pleno.

O começo da psicanálise na visão de Winnicott

Trecho do livro “Tudo começa em casa” de D. W. Winnicott:

Psicanálise e ciência: amigas ou parentes? (texto escrito em 1961)

“A psicanálise é um método para tratar pessoas psiquiatricamente doentes através de meios psicológicos, ou seja, sem aparelhos, drogas ou hipnose. Foi desenvolvida por Freud na virada do século, época em que a hipnose estava sendo usada para eliminar sintomas. Freud ficou insatisfeito com seus resultados e com os de seus colegas e, além disso, descobriu que quando removia um sintoma pela hipnose, não progredia na compreensão do paciente. A partir daí, adaptou o uso da hipnose a um contexto em que trabalhava com o paciente, em condições de igualdade, deixando que o tempo trouxesse o que fosse possível. O paciente vinha diariamente, a uma hora fixada, e não havia pressa em eliminar os sintomas, pois algo mais importante havia emergido: a capacidade do paciente de revelar-se a si mesmo. Dessa forma, Freud também ficava informado e usava as informações obtidas tanto para interpretar o paciente naquele instante, como para ir gradualmente construindo uma nova ciência: a ciência a que hoje chamamos psicanálise e que também poderíamos chamar de psicologia dinâmica.”